terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Não quero ser o último a comer-te

Não quero ser o último a comer-te

Não quero ser o último a comer-te.

Se em tempo não ousei, agora é tarde.
Nem sopra a flama antiga nem beber-te
aplacaria sede que não arde

em minha boca seca de querer-te,

de desejar-te tanto e sem alarde,
fome que não sofria padecer-te
assim pasto de tantos, e eu covarde

a esperar que limpasses toda a gala

que por teu corpo e alma ainda resvala,
e chegasses, intata, renascida,

para travar comigo a luta extrema

que fizesse de toda a nossa vida
um chamejante, universal poema.

Carlos Drummond de Andrade

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